27.5.10

O réptil

Em fim de ciclo, o treinador de futebol está sozinho na selva e é o primeiro a ouvir barulho da cobra no mato, a arrastar o fim.
Hoje o estádio está cheio, os jogadores está a marcar muitos golos, o futebol que a equipa tem para apresentar podia até ser vendido em pequenos frascos como um perfume. O barulho nas bancadas tem o cheiro da vitória. Estão todos surdos no estádio, menos um. No clube em que está, o treinador sabe que quanto mais longe do primeiro lugar, mais perto da porta de saída. Mais perto da selva.
Num passe mais largo rente ao chão, o som do couro da bola a cortar a relva entra nos ouvidos no treinador como o tal barulho da cobra prestes a engolir um homem inteiro. O animal que o devora, não o devora sem antes lhe deixar as pistas todas sobre a evolução da relações humanas. Os répteis não sobrevivem sem a renovação dos tecidos. Não crescem sem a mudança total e recorrente de pele. Uma pele velha que tenha resistido à substituição pode fazer apodrecer os novos tecidos ou pode causar necroses. Elementar meu caro treinador de futebol.
Nesta fase de peles em trânsito, a nova que está para chegar, mas que só chegará saudável se tiver havido a remoção total da anteriro, nesta fase a ciência aconselha: nada de stress e cuidados com parasitas externos.
Um clube de futebol sobrevive no jogo da imitação dos répteis. O treinador é a pele. A essa, já vimos o que acontece de tempos a tempos.

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